“Todo mundo tá falando demais!
Por Facebook, por e-mail, por esmero,
Por carta, por desespero,
Todo mundo quer falar.
Ao pé do ouvido, por gesto, por ousadia,
Timidez ou covardia,
Por não saber escutar.“
Da música ‘Todo Mundo Tá Falando’, de Oswaldo Montenegro.
Uma das capacidades mais espetaculares dos seres humanos é a de entender e ser compreendido. No entanto, sabemos que, infelizmente, a maioria das pessoas não escuta e se o faz é unicamente com o objetivo de responder.
Responder é reagir, e reagir não é escutar. Porque a arte de ouvir acontece diante do silêncio.
Olhe para estas palavras e misture-as. Escutar. Silenciar. Compreender. Quase um anagrama.
A essência da escuta está no silêncio que não julga, não questiona e não tenta consertar nada.
Portanto, seja o silêncio que é necessário quando alguém fala.
Para muitos, ficar em silêncio é como estar inativo, embora ouvir implique o ato da atenção e da consideração.
O silêncio não é supressão; é onde começa a compreensão.
Então, da próxima vez que estiver preparado para falar, perceba que pode ouvir e aprender em silêncio. A arte de ouvir começa com: O silêncio como fonte do reconhecimento; o silêncio como presença e apreciação; o silêncio como a gênese de nos conectarmos ao outro.
Se você pode suportar o silêncio você provavelmente vai entender as palavras faladas.
Ouvir nosso interlocutor de verdade, é quase uma ousadia, além de uma atitude muito nobre e extremamente sensível. É um presente extraordinário que podemos oferecer aos nossos amigos, familiares queridos, comunidades e pessoas que nos sejam próximas ou não.
É tão importante que deveriam existir oficinas planejadas para cultivar a habilidade da escuta, o que, indiscutivelmente, nos ajudaria a construir relacionamentos muito mais saudáveis. Alguém duvida disso?
Muitos de nós carregamos a ilusão de que não é necessário cultivar esta aptidão ou, mesmo, praticá-la a fim de entendermos melhor esta arte. É preciso entender que, como qualquer outro talento, a escuta pode ser aprendida e melhorada com tempo e dedicação.
A escuta cuidadosa, intencional e eficaz pode ser ensinada e aprendida, mas, no fundo, é bem mais do que uma habilidade ‘criada’. É um jeito de ser. É feito um músculo que pode ser exercitado – tanto com força quanto tenacidade.
Escutar é uma ação e não uma mera atitude passiva. Para ser ouvido, é necessário que alguém fale e outro escute. Verdadeiramente.
Escutar, de acordo com esse princípio, requer a existência de duas pessoas, uma das quais realiza o ato de falar e transmitir, enquanto à outra pessoa é dada a possibilidade de escutar com toda a atenção.
Escutar é a principal maneira de expressar presença.
Uma das melhores dicas para realizarmos este exercício de modo mais pleno é procurando nos concentrar, exclusivamente, nos sentimentos demonstrados por aquele com quem dialogamos ‘esquecendo’ o problema relatado em si. Ouvir atentamente e repetir, em seguida, aquilo que ouvimos, de preferência, com as mesmas palavras. Sem acrescentar nada, sem alterar coisa alguma, sem julgar. E apenas depois experimentar nomearmos os sentimentos percebidos.
Assim:
“Parece que isto que está me relatando despertou um sentimento de raiva em você. Ou de muita tristeza. É isso mesmo?”
Esse conceito de escuta é chamado de escuta ativa ou empática. E implica numa disponibilidade muito específica e bastante delimitada, cuja dinâmica redundará na busca do reconhecimento do sentimento acima do mero conteúdo.
Escutar, em qualquer um dos significados que dermos a este termo, implica não orientar, não aconselhar e não manipular. Todas essas ações podem estar muito presentes potencialmente, mas não devem aparecer.
Escutar é acompanhar sem interferir.
É preciso compreender que há um maravilhoso valor catártico neste pensar em voz alta e compartilhar o problema com outro ser que está fora da gente, mas que, ainda assim, entende para além do nosso desabafo: identifica nossos sentimentos.
Nós ouvimos com nossos ouvidos, mas escutamos com nossos olhos, mente, coração, estômago e pele.
A intimidade pessoal é lançada para fora, mas o nível de pressão e conflito exige uma abertura para o outro, uma vez que a pessoa experimenta a dificuldade de conviver consigo mesma.
Ao mesmo tempo em que experimenta a necessidade de falar, de se abrir, ela também percebe o acolhimento, ou não, daquele que a ouve. Quer dizer, ouvir é um prolongamento da aceitação daquilo que o outro diz.
Empatia é a capacidade de estabelecer um laço de humano para humano no qual se pode ouvir o profundo sofrimento da outra pessoa, além das palavras ditas, em busca das emoções e necessidades ocultas por trás dos julgamentos, ataques, críticas, recusas ou reclamações. A empatia tenta entender a realidade que os outros não percebem, experimenta perceber os sentimentos e necessidades por trás do que é aparentemente apenas ‘mais uma queixa’.
Os pré-requisitos para este tipo de sintonia envolvem a qualidade da presença e total atenção ao que a outra pessoa experimenta, assim como a capacidade de rejeitar preconceitos e julgamentos e a condição de oferecer ao outro o tempo e o espaço de que precisa para se expressar e se sentir compreendido.
Porém, são justamente esses pré-requisitos que tornam a empatia real muito difícil de oferecer. Porque, muitas vezes, tendemos a aconselhar, a tranquilizar, a expor nossas próprias experiências, a dar receitas milagrosas prontas ao invés de apenas nos aproximarmos daquilo que a pessoa está nos dizendo.
Quando a escuta for positiva, aquele ‘algo’ chegou ao seu destino e a intensidade do conflito no seu portador ficou diluída.
Quando falamos e ouvimos, o enredo da intersubjetividade da convivência e do fato de ser sujeito social nos é revelado.
Ouvir é ter consciência de quem está falando. O fundamento da escuta é o profundo respeito pelo outro. A escuta ativa envolve aceitar o que é dito sem qualquer questionamento ou crítica. Ouvir é uma das formas mais poderosas de interagir com o ser humano.
Escutar é silenciar meu ser, é silenciar meu egoísmo, é curar minha ferida narcísica e meu desejo de onipresença frente ao outro. A pessoa que escuta precisa ser “descentrada” de si mesma.
Pois, paradoxalmente, a pessoa é muito mais “ela mesma” quanto menos ela está nela. Quanto menos está ‘cheia de si’.
Pois somente desta forma criamos um espaço de silêncio que nos permite, dentro de um clima de confiança e autenticidade, compreender as necessidades, os sentimentos e as motivações da outra pessoa. É como se nos transformássemos numa espécie de espelho que entende que o outro conhece, melhor do que ninguém, o que realmente precisa.
Então, nunca percamos de vista que para realmente escutar é essencial que ouçamos a nós mesmos. Quando praticamos a escuta ativa, mostramos interesse pelo outro através do feedback, dando a ele espaço para que reflita e usando a pergunta como uma ferramenta para encontrar a solução que ele está procurando, já que só ele pode encontrar o que está dentro de si. E em nenhum outro lugar.
Por Heloisa Lima, do blog “O sentido o ser” >> https://psicologaheloisalima.com