É frequente pessoas presumirem que conteúdo é algo neutro, objetivo, verdadeiro por si mesmo. E não é. O conteúdo na escola, e fora dela, tem uma marca de preconceito eventual, de ideologia; é marcado também pela capacidade de se olhar a partir de um ponto de vista. Por exemplo, eu fui alfabetizado em Londrina, cidade onde nasci, no norte do Paraná, com uma cartilha que muita gente conhece, chamada “Caminho suave”, de uma autora já falecida, Branca Alves de Lima.
Essa cartilha, especialmente no sudeste, ajudou a educar dezenas de gerações. Lá pelas tantas, a cartilha tinha um desenho de uma família. Era um pai sentado na poltrona lendo um jornal. Atrás da poltrona, em pé, a mãe, com um avental e uma bandeja com cafezinho. Num canto, um menino brincando com um caminhãozinho e, no outro canto, uma menina brincando com uma boneca. Diríamos “que bonito”, mas ali tinha uma ideia.
Talvez não fosse o propósito da autora fazer com que pensássemos isso, mas acabávamos sendo induzidos a pensar que homens leem jornal enquanto mulheres servem cafezinho, e que meninos brincam de caminhãozinho e meninas brincam de boneca. Um conteúdo que induz a um determinado tipo de pensamento.
É preciso ter sobre o conteúdo escolar, sobre o conteúdo das mídias em geral, um olhar crítico. Não fazer com que se olhe aquilo como algo que, porque está no livro ou que foi mostrado na tv, ou porque se ouviu no rádio que ele, obrigatoriamente, é algo que tem um nível de veracidade, sem que haja a possibilidade de preconceito. Não é assim. Conteúdo também carrega ponto de vista.
Por Mario Sergio Cortella, Do livro “Pensar bem nos faz bem! – filosofia, religião, ciência e educação (p. 41).